domingo, 10 de janeiro de 2016

PAÍS É ENTREGUE AO CRIME



CORREIO DO POVO 09/01/2016 20:52


Cíntia Marchi



"Sem presença do Estado, país é entregue ao crime", avisa Sindireceita. Equipe registrou abandono das aduanas em Porto Soberbo, Porto Vera Cruz e Porto Lucena



Três de cinco pontos aduaneiros no Noroeste gaúcho, divisa com a Argentina, encontram-se fechados. A denúncia é feita pelo Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal (Sindireceita) que, em novembro passado, percorreu toda a região para identificar as deficiências dos postos localizados na fronteira. A avaliação é negativa, na opinião do diretor de Assuntos Aduaneiros do Sindireceita, o analista-tributário Moisés Boaventura Hoyos. “Enquanto não dermos valor à proteção das fronteiras, vamos ficar nos perguntando de onde vêm as armas, os produtos piratas, as drogas”, diz.

Em 2014, no RS, foram apreendidas 7,9 mil armas de fogo e 8,5 toneladas de drogas, segundo dados da Secretaria Estadual da Segurança Pública. “Sem a presença do Estado nas fronteiras, entregamos nosso país ao crime organizado”, considera Hoyos. A equipe do Sindireceita percorreu mais de 1,7 mil quilômetros de rodovias federais e estaduais e estradas de terra e navegou trechos do rio Uruguai, em cinco dias de visitas técnicas. Registrou abandono pela Receita Federal das aduanas em Porto Soberbo, Porto Vera Cruz e Porto Lucena. “Notamos que as estradas e a mobilidade próximo a estes postos melhoraram muito, mas, em contrapartida, a Receita saiu de lá. Enquanto se melhorou o acesso, o controle deixou de existir.”

Em Porto Mauá e Porto Xavier, o Sindireceita encontrou as estruturas em funcionamento e registrou incremento de equipamentos em relação à última vistoria em 2010. Nos dois postos aduaneiros abertos trabalham dez analistas-tributários (três em Porto Mauá e sete em Porto Xavier) e cinco auditores-fiscais (um em Porto Mauá e quatro em Porto Xavier). Os servidores atuam em horário comercial e em esquema diferenciado nos finais de semana e feriados.

Onde não há mais a presença da Receita, Hoyos conta que foram flagrados vários locais de atracação de barcos ao longo do rio Uruguai, o que indica que a passagem de mercadorias e pessoas de um ponto a outro ocorre livremente, sem obstáculos de fiscalização. Segundo relatório do Sindireceita, nestes locais existem apenas balsas que recolhem taxas pelo uso do transporte. “Ficamos pouco mais de uma hora em Porto Soberbo, onde tem a balsa. Por ali, entraram e saíram do Brasil cerca de 60 carros. Mesmo que o fluxo seja pequeno, tem que haver um controle”, defende o analista.


Receita: pontos não fazem o controle

O superintendente da Receita Federal do Brasil no RS, Paulo Renato Silva da Paz, diz que os três pontos aduaneiros – Porto Soberbo, Porto Vera Cruz e Porto Lucena – nunca foram recintos alfandegados da Receita Federal. Ele explica que servidores cumpriam horários nestes locais, mas que o sistema acabava não tendo efetividade. “Estes pontos nunca permitiram fazer o controle de contrabando e descaminhos, até porque o contrabandista nunca vai passar por uma balsa sabendo que vai enfrentar fiscalização na chegada ao ponto aduaneiro.”

Segundo Paz, a repressão da entrada de bens ilícitos deve ser feita por meio de investigação, já que nos postos alfandegados o trabalho dos servidores é dedicado mais à exportação, importação, entrada e saída de pessoas. O superintendente acrescenta que o tamanho da fronteira seca do Brasil – quase 17 mil quilômetros – e o número insuficiente de servidores dificultam a investigação e fiscalização. “É muito difícil impedir que haja ingresso de mercadorias ilícitas, porque existe uma série de atracadouros clandestinos que fogem ao nosso controle.”

De janeiro a novembro de 2015, foram apreendidos no Estado 10 milhões de maços de cigarros contrabandeados, um dos itens mais apreendidos pela Receita. O valor, que já alcança R$ 44 milhões, supera os R$ 42 milhões registrados em 2014. Conforme Paz, 351 servidores da Receita Federal trabalham nas seguintes unidades: Bagé (24), Barra do Quaraí (3), Chuí (42), Itaqui (7), Jaguarão (28), Porto Mauá (5), Porto Xavier (10), Quaraí (10), Santana do Livramento (59), São Borja (32), Três Passos (7) e Uruguaiana (124).