sexta-feira, 4 de abril de 2014

NEGÓCIOS COM BEIRA-MAR



ZERO HORA 04 de abril de 2014 | N° 17753


SUA SEGURANÇA | HUMBERTO TREZZI




Nascido e criado em Ponta Porã, numa das mais violentas fronteiras do mundo (cidade-gêmea da paraguaia Pedro Juan Caballero), Jarvis Chimenes Pavão tem ligações com o Paraguai que não se limitam ao meio nome castelhano. Atualmente, o seu endereço é o cárcere de Tacumbu, em Assunção, onde é popular por distribuir comida e pagar advogado para os presos menos favorecidos. Ali se espremem 3,3 mil presos, em condições tão ruins como as do Presídio Central .

Pavão fugiu do Brasil após ter a prisão preventiva decretada, em 2000. Só foi capturado em dezembro de 2009, por policiais paraguaios, dentro da Operação Aliança (que estabelecia cooperação de brasileiros e paraguaios contra o crime). Em uma rara entrevista, em 2011, admitiu ter longa carreira no crime e ter sido viciado em drogas.

– Nunca neguei que fui traficante. Eu fui usuário. Usei droga sete anos. Cocaína. No dia 10 de outubro de 1991, eu tive a última overdose. Tive três overdoses e parei. Graças a Deus! Sei o que é o efeito da cocaína – disse à revista Época.

A PF tem várias teses sobre Pavão. Ele teria feito negócios com Fernandinho Beira-Mar, líder do Comando Vermelho. Seria plantador de maconha e atravessador de cocaína, comprada direto da guerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Seu contato no Estado seria a organização Os Manos. Em Santa Catarina, Neném da Costeira, chefão do varejo do tráfico em Florianópolis. Telefonemas grampeados e depoimentos garantem a ele, com essa nova operação dos federais, um lugar na galeria dos fornecedores de droga para o Rio Grande do Sul.


CONEXÃO ASSUNÇÃO

Tráfico comandado de presídio no Paraguai. Operação da PF apreende 1,2 tonelada de drogas e desarticula quadrilha


Sem tiros, com pouco barulho, a Polícia Federal (PF) desarticulou aquela que considera uma das maiores quadrilhas de drogas em atuação no Rio Grande do Sul. O trabalho começou em junho, com 12 flagrantes desde então, que resultaram na prisão de 48 pessoas, apreensão de 1,2 tonelada de drogas, R$ 165 mil em espécie, 24 veículos (incluindo um motor home) e armas de calibre restrito (entre elas um fuzil AR-15, sete pistolas e uma submetralhadora). O inusitado, segundo a PF, é que o bando era chefiado de dentro de um presídio em Assunção, capital do Paraguai.

Conforme as investigações, a cocaína era encomendada na Bolívia pela quadrilha liderada pelo brasileiro Jarvis Chimenes Pavão, preso na Penitenciária de Tacumbu, em Assunção. Após chegar ao Paraguai, era receptada em Ciudad del Este (na fronteira com o Brasil) por dois gaúchos, que dali faziam a droga atravessar a fronteira e ir para o Rio Grande do Sul, onde era redistribuída em células em Novo Hamburgo (Vale dos Sinos) e Santa Cruz do Sul (Vale do Rio Pardo).

200 quilos de cocaína seriam transportados em aeronave

O rastreamento do esquema culminou ontem, com a denominada Operação Panóptico, que resultou na captura de 15 pessoas em Porto Alegre, Sapucaia do Sul, Novo Hamburgo, Campo Bom, Estância Velha, Santa Cruz do Sul e Farroupilha. Ao longo das investigações foram presos os líderes, os fornecedores, os transportadores e revendedores.

– Se seguisse atuando, iria aumentar em muito a circulação de drogas no Estado – afirmou o superintendente da PF gaúcha, Sandro Caron.

Conforme Caron, na medida em que as cargas eram interceptadas, e traficantes presos, a quadrilha mudava o modo de agir. Depois da apreensão de um motor-home, os criminosos passaram a remeter drogas em carros. Como o garrote prosseguiu, o bando planejou usar uma aeronave boliviana para o transporte de 200 quilos de cocaína, que seriam arremessados em uma propriedade em Mostardas, ação que acabou não se concretizando.

Caron fez questão de destacar a atuação dos agentes da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE). Ao todo, 40 policiais trabalharam durante 10 meses. Nas investigações, o agente da PF Adécimo Joel Branco, 56 anos, morreu. Ele estava em uma viatura que capotou ao ser abalroada por traficantes durante perseguição na BR-386, em 11 de outubro, em Triunfo. O autor do abalroamento foi preso e deve responder por homicídio e tráfico de drogas – tinha 40 quilos de cocaína na caminhonete.

Sandro Caron. Superintendente da PF no Estado - ‘‘O crime sofreu um golpe, com a completa desarticulação dessa quadrilha.”

JOSÉ LUÍS COSTA

COMO FUNCIONAVA O ESQUEMA. Bando abastecia Região Metropolitana, Vale do Sinos e a Serra

- A cocaína era encomendada na Bolívia pela quadrilha liderada pelo sul-mato-grossense Jarvis Chimenes Pavão, preso no Paraguai.

- Os gaúchos Fabrício Santos da Silva, o Nenê, e Ênio Santos de Souza, radicados em Ciudad del Este, na fronteira do Brasil com o Paraguai, compravam a droga de Pavão e a remetiam para o Rio Grande do Sul.
- Segundo a PF, até ontem Ênio e Nenê seguiam comandando o bando de dentro das cadeias. Nenê esta recolhido na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas e Souza, no Presídio Central.

- A droga era enviada para Novo Hamburgo. De lá, uma parte ia para Santa Cruz do Sul e distribuída para revendedores na Região Metropolitana e Serra.